Resenha de Amor, Opressão e Liberdade de Ricardo Faria

           O segundo volume da trama iniciada em O amor nos tempos do AI-5- tem início no ponto exato de término do primeiro volume. Como toda a trama desenvolve-se a partir deste ponto em Amor, Opressão e Liberdade de Ricardo Faria, não há como não mencioná-lo.

        Confira a resenha de O Amor nos tempos do AI-5 aqui neste link:

https://cafe-literatura8.webnode.com/news/resenha-de-o-amor-nos-tempos-do-ai-5-de-ricardo-faria/

       Agora vamos falar da continuação, Amor, Opressão e Liberdade:

         O casamento de Celina e Afonso chegou ao fim após o tiro fatal que ele e Haydée receberam durante o assalto ao banco.

         Até então, era Afonso quem gerenciava a rotina financeira e familiar. Ele, Celina, e as crianças Bia e Nelson e os relacionamentos paralelos entre os adultos – tanto Haydée quanto Toninho- faziam parte dessa família extendida.

         O quarteto que se formara no primeiro volume da trama viu-se desfeito a um só tempo, de forma abrupta e definitiva.

       Com naturalidade, Celina procurou apoio em Toninho nessa nova fase e, embora o relacionamento entre eles já existisse há algum tempo, não era de conhecimento dos filhos de Celina.

          Sendo assim, houve um período de luto, onde o autor Ricardo Faria demonstrou de forma acertada as fases do sofrimento experimentado por Celina e pelas pessoas que, como ela, sofreram com a perda de seus entes queridos, sejam por quais razões forem.

        É interessante pontuar aqui que, embora Afonso tenha morrido junto a Haydée, em nenhum momento Celina questionou a fidelidade do marido ou sentiu-se traída.

       Outra questão interessante é que a trama de Amor, Opressão e Liberdade inicia-se em 17 de Agosto de 1972, numa época em que as crianças eram poupadas de sofrimentos do mundo dos adultos.

       Quando algo dessa magnitude acontecia, eles se deparavam com a realidade crua dos fatos e era motivo para muita rebeldia, em especial na adolescência. Porém, as crianças muitas vezes assumiam esse lugar dos adultos e amadureciam rapidamente, como foi o caso de Nelson.

         Nelson assumiu para si os livros da biblioteca particular de Afonso e também os recortes do pai, onde ele guardava textos e material para suas aulas de História. Agora era ele, Nelson, quem recorria ao padrinho e professor Guerra para esclarecer-se sobre a política e reabertura após o término do AI-5 em 1979 e da redemocratização do país. E ainda durante o enterro do pai, comunicou à Celina que iria tornar-se professor como Afonso.

       Se no primeiro volume a questão politica estava mais evidente no enredo, neste volume ela ficou um pouco mais subentendida, ainda que estivessem presentes, tais como a redemocratização do país cujos representantes  ainda eram eleitos pelo voto indireto; o monstro da Inflação; e as demais questões nacionais e internacionais tenham sido pontuadas pelo autor e as consequente interferências, quer de forma direta ou indireta, da política do Brasil na vida de todos os cidadãos.

        Como eu vivi essa época de transição ( nasci pouco mais de um mês após o início da trama)  experimentei reviver, através da leitura, certas cenas e sentimentos daquela época e que hoje apenas fazem parte da história para muitos dos leitores da atualidade.

          As músicas de protesto dos anos 70 – dos grupos musicais Secos e Molhados, Os Mutantes dentre outros- e dos anos 1980 - que foi menos mencionado na trama, mas podemos citar Legião Urbana e Barão vermelho/Cazuza- foi uma forma de a população expor as mazelas que percebiam na sociedade brasileira da época. Ainda sofrendo os efeitos da ditadura, a população encontrava nas letras repletas de metáforas e linguagens figurativas, a forma sutil de denunciar a falta de liberdade e a opressão do povo Brasileiro, que ansiava por liberdade.

        Celina encontrou em Afonso o parceiro ideal para explorar a própria sexualidade. Porém, tal parceria ela não encontrou no machista Toninho. Enquanto ele era o amante, Toninho mostrava-se bastante tolerante, mas ao assumir a posição de “marido”- ainda que em nenhum momento isso tenha se concretizado- Toninho revelou uma forma tradicional de conduzir a relação, desgostando Celina. Ainda assim, ele foi extremamente importante nesse primeiro momento da trama e ao longo de boa parte das 271 páginas do enredo.

     Uma das personagens que mais evoluiu ao longo da trama foi Bia, que no primeiro livro era uma menininha e que agora sai de uma garota traumatizada ao se deparar pela primeira vez com a morte até uma mulher em busca de sua sexualidade.

      Mais uma vez Ricardo Faria acerta no tom do erotismo na trama. Num primeiro momento, é Celina quem se depara com o moralismo ainda presente no tradicionalismo da sociedade brasileira da época e, numa segunda etapa- que não existe de fato, é só um olhar diferenciado sobre a obra- é Bia quem assume o protagonismo do Amor, Opressão e Liberdade e com sua rebeldia e amadurecimento demonstra na própria narrativa tanto a liberação feminina quanto a evolução do cidadão brasileiro, que sai da infância política em busca de uma maior conscientização de sua escolha de representantes.

 

     Duas músicas podem retratar os dilemas enfrentados nos anos 70 e 80.

     A letra representativa dos anos 70 é o Sangue Latino (1973) na voz de Ney Matogrosso, vocalista do grupo “Secos e Molhados” e ainda hoje tem uma carreira solo.

     “Sangue Latino” dentro desse contexto invoca toda a força do nosso sangue contra o que nos é imposto, chama a raiz do povo latino-americano, pede para que não sejamos vencidos. É um hino de resistência a uma ameaça de nos calar a voz. Que possamos encontrar a força pra isso no exemplo das pessoas que deram a vida (meus mortos) para que tivéssemos a liberdade que hoje temos!

 

Sangue Latino (Secos e Molhados)

Link do video:

https://www.youtube.com/watch?v=-zLicyzaH5A

Jurei mentiras/E sigo sozinho/

Assumo os pecados/Os ventos do norte/

Nao movem moinhos/E o que me resta/

É só um gemido

Minha vida, meus mortos/Meus caminhos tortos/

Meu sangue latino/Minh’alma cativa

 

Rompi tratados/Traí os ritos/

Quebrei a lança/Lancei no espaço/

Um grito, um desabafo.

 

E o que me importa/É não estar vencido/

Minha vida, meus mortos/Meus caminhos tortos/

Meu Sangue Latino/

Minh’alma cativa

 

 

 

  E a outra, representativa dos anos 80 é Lança Perfume de Rita Lee, vocalista dos Mutantes e ainda hoje em carreiro solo de sucesso.

   Nesse vídeo de lançamento, repare na moda dos patins que foi um grande sucesso e marcou o comportamento da época. Além disso, Lança Perfume fala de drogas de forma mais sutil, comparando-a ao relacionamento inebriante da época e liberação feminina. Essa música me remete tanto a Celina quanto a Bia, que evolui numa jovem mulher ao longo da trama.

  

Lança perfume ( Rita lee e Roberto de Carvalho)

Link do video:

 

https://www.youtube.com/watch?v=GDS5dDQ4_LI

 

 

Lança menina/Lança todo esse perfume/

Desbaratina/Não dá pra ficar imune/

Ao teu amor/Que tem cheiro/

De coisa maluca.

 

Vem cá, meu bem/Me descola um carinho/

Eu sou neném/Só sossego com beijinho/

Vê se me dá o prazer/De ter prazer comigo.

 

Me aqueça!/Me vira de ponta cabeça/

Me faz de gato e sapato/E me deixa de quatro no ato/

Me enche de amor, de amor/Oh!/

 

Lança menina/Lança todo esse perfume/

Desbaratina/Não dá pra ficar imune/

Ao teu amor que tem cheiro/De coisa maluca.

 

Vem cá, meu bem/Me descola um carinho/

Eu sou neném/Só sossego com beijinho/

E vê se me dá o prazer/De ter prazer comigo.

 

Me aqueça!/Me vira de ponta cabeça

Me faz de gato e sapato/

Ah! Ah!/Me deixa de quatro no ato/

Me enche de amor, de amor/

Oh!/Lança! Lança perfume/Oh! Oh! Oh! Oh!/

Lança! Lança perfume/Oh! Oh! Oh!

Lança! Lança!…

 

 

       Um livro para finalizar a trama com louvor e repetir o sucesso do primeiro.

       Vale a pena ler, refletir e conhecer toda a trama de Amor, Opressão e Liberdade de Ricardo Faria.

 

      Amor, Opressão e Liberdade estará no debate do Em Pauta:Café literatura 3☆2018 em 19 de Maio às 19 horas. Acesse o link e confirme agora mesmo sua participação e no sorteio de um exemplar entre os participantes do evento!

Link:https://www.facebook.com/events/368013993696703/

 

                                                      Michelle Louise Paranhos- autora e critica literária.